13ª

Ministério do turismo, secretaria especial da cultura e belgo bekaert arames apresentam

Paraisópolis
(pesquisa realizada pelo cocurador Pedro Smith)

Paraisópolis, São Paulo - SP

Eu trabalhei por alguns anos na urbanização de Paraisópolis, uma das maiores favelas da cidade de São Paulo, tanto em número de habitantes, como na extensão territorial. Este trabalho foi, em minhas lembranças, a experiência mais complexa, angustiante e desafiadora da minha vida. Sentia-me no meio de muitos embates práticos, éticos e emocionais. Como costumo dizer atualmente: depois desta experiência “o resto foi perfumaria”. 

Ainda me questiono como era trabalhar num local com tantos problemas estruturais, socioeconômicos, inserido dentro de um dos bairros mais nobres da cidade (o Morumbi). Busco apresentar, por meio de duas parceiras muito queridas, que trabalharam comigo neste projeto, um pouco desse olhar.

A Jaci, uma pessoa porreta demais que conheci, era moradora de Paraisópolis no período que trabalhei por lá (atualmente vive em Pernambuco e trabalha como assistente social) e atuava como “agente comunitária”: moradora que nos auxiliava, pessoas forasteiras. Atendendo ao meu pedido, ela fez uma poesia belíssima sobre Paraisópolis para esta 13ª BIA, que pode ser vista pelo vídeo gravado por ela, e lida a seguir: 

 

“Contexto urbano”
Falar de Paraisópolis
No contexto da cidade
Ainda continua sendo
Falar de informalidade
Fazer parte do contexto
Da cidade formal
É o sonho de todo mundo
Que mora no ilegal
Falar sobre o concreto
Que não tem acabamento
Que transforma em moradia
O tijolo e o cimento
Falar sobre essa força
Que existe na favela
Que se renova todo dia
Dentro de cada viela
Falar dessa violência
Que toma toda cidade
Mas é dentro da favela
Que ela tem veracidade
Falar como moradora
Dizer como me sentia
É falar da dificuldade
Que enfrentava todo dia
Querer ser reconhecido
Como um simples cidadão
É o sonho de todo mundo
Que mora lá no grotão
Fala da dificuldade
De chegar em casa com as compras
O carro não chega na porta
A viela é muito longa
Falar da resiliência
De morar nesse local
Ter que provar todo dia
Que não é um marginal
A luta pelo direito
De acesso à moradia
Faz parte do cotidiano
E do nosso dia a dia.
Escrito para a 13ª BIA por Jacilene Ferreira.

Outra pessoa que conheci naquele momento e se tornou uma das maiores e incríveis guerreiras que conheci na vida foi a Lúcia Ágata, assistente social que coordenava a equipe de campo social na obra de urbanização de Paraisópolis. As grandes buchas, de fato, sobravam para esta equipe. A outra, era a “equipe técnica”, ligada à arquitetura (eu) e engenharia (como se o trabalho dela e de sua equipe não fosse técnico…).  A Lúcia, também atendendo ao meu pedido, gravou um áudio lindo sobre esta nossa experiência em Paraisópolis.

 

A seguir pode-se conferir uma foto tirada por mim, em 2010, da obra de urbanização em Paraisópolis, que retrata o Grotão, uma das maiores áreas de risco geológico do município de São Paulo:

TRANSCRIÇÃO DO ÁUDIO DE LÚCIA ÁGATA:

Reflexão de Lucia, assistente social da Prefeitura e coordenadora da “equipe social”, responsável pela interlocução geral com moradores na obra de urbanização de Paraisópolis

Paraisópolis é, na verdade, para mim, uma história de resistência. Estamos falando de um território com mais de vinte mil domicílios, morando num local gravado ali na Vila Andrade, Morumbi (bairro de alta renda de São Paulo).

São pessoas que estão resistindo, morando naquela área há mais de trinta anos. Eu trabalhei lá num período que foi de 2006 a 2009, na obra de urbanização. E dentre todas as minhas experiências de Paraisópolis, eu gostaria de destacar um aspecto: a participação popular. O quanto tivemos espaço de participação, fundamental, na forma como as obras deveriam acontecer. 

Paraisópolis foi um território que, quando começamos com a obra de urbanização, nós não tínhamos muita proposição de reassentamento das famílias, embora a gente tivesse muita remoção a ser feita. E, obviamente, a necessidade e a velocidade que a obra tinha que ser feita. Mas, os moradores, nas figuras de suas principais lideranças, se articularam, com todas as suas dificuldades e tiveram muitas conquistas. Contando assim parece uma história bastante simples. Mas, na verdade, foi um processo de muita discussão, embate, muita polêmica, mas, verdadeiramente, de muita resistência dessas pessoas, para que elas pudessem continuar morando naquele território em que sua vida está organizada, em que seus laços comunitários e familiares estão estabelecidos, onde tem muita solidariedade, muito apoio das pessoas e que, numa situação de vulnerabilidade isso é muito essencial.

(Continua)

Pedro Smith