Mudanças do clima e as vivências e saberes no espaço local: um Experimento de Mundo Real em Ponta Negra, Natal/RN

Pesquisadores: Sarah de Andrade e Andrade, Ruth Maria da Costa Ataíde, Venerando Amaro Eustáquio, Zoraide Sousa Pessoa

Resumo:

O projeto intitulado “Mudanças do clima e as vivências e saberes no espaço local: um Experimento de Mundo Real em Ponta Negra, Natal/RN” – reduzido, para referência, pela palavra VIVERES – está vinculado ao projeto de extensão Fórum Direito à Cidade** e ao projeto de pesquisa “Áreas urbanas brasileiras em perspectiva transdisciplinar: avaliação, cenários e soluções para adaptação às mudanças climáticas e ao desenvolvimento sustentável” do INCT Klimapolis. 

As transformações no comportamento do clima geradas pela atuação antrópica, tem gerado fortes impactos à vida humana e não humana ao redor do mundo. Não por acaso, os países, territórios, cidades e espaços mais vulnerabilizados, e que normalmente pouco contribuem com a emissão de Gases do Efeito Estufa – GEE, são aqueles que mais sofrem com os eventos extremos (CEPAL, 2011). A isso associa-se às consequências materiais e imateriais de um modelo predatório (quase universal) de urbanização que impede, sobretudo, no Brasil, o alcance do desenvolvimento urbano sustentável. 

Diante do desafio de adaptar o modo de vida contemporâneo, especialmente nas cidades, ao enfrentamento de tais eventos, as pesquisas aplicadas – como aquelas desenvolvidas em Laboratórios de Mundo Real – LMR -, são importantes instrumentos de desenvolvimento de soluções baseadas na ciência, respeitando, ao mesmo tempo, a identidade, a realidade e as experiências daqueles que vivem nos territórios em discussão. 

Nos LMR, são desenvolvidos os Experimentos de Mundo Real – EMR, uma abordagem que combina diversos tipos de conhecimento para capacitar lideranças na condução de melhorias em suas localidades, impulsionando o desenvolvimento urbano sustentável em nível local (Experimento de Mundo Real, s/d). Apesar de manter sua terminologia, os Laboratórios e Experimentos não se dão nos limites dos tradicionais laboratórios científicos. Ao contrário, buscam o estudo e a experimentação em ambientes que não podem ser controlados, considerando a complexidade inerente aos sistemas sociais, ambientais e tecnológicos, para a troca de saberes e a coprodução do conhecimento. Dessa forma, são importantes tanto o produto – o protótipo, a simulação, a política, o plano, o projeto, a obra, etc. – quanto o processo e as aprendizagens por ele proporcionadas. 

Nesse sentido, o projeto VIVERES está amparado pela intenção de criar um ambiente compartilhado para reflexão e construção de soluções de adaptação para o bairro e a orla da Praia de Ponta Negra. Ali, no ano de 2024, foi implementada a 

maior obra de adaptação climática da cidade de Natal – capital do Rio Grande do Norte -, o aterro hidráulico ou engorda da Praia de Ponta Negra. 

O processo que resultou na obra, iniciado ainda em 2012, foi uma espécie de porta de entrada para aprofundar os contatos e estreitar os laços entre professores-pesquisadores-extensionistas do Departamento de Arquitetura, Políticas Públicas e Engenharia Civil e Ambiental. Tal aproximação e a afinidade entre as abordagens metodológicas utilizadas em seus respectivos projetos, resultou na parceria entre o projeto de extensão Fórum Direito à Cidade e o INCT Klimapolis. Estes compõem o “núcleo acadêmico” do EMR. 

Conformando o “núcleo comunitário” do projeto, estão os agentes sociais engajados em entidades e grupos populares de luta por melhores condições de vida no bairro e na Vila de Ponta Negra, uma das Áreas Especiais de Interesse Social – AEIS da localidade, bem como pela atenção às suas vozes no planejamento e gestão do território. Diante desta problemática, ou seja, a desconsideração, pelo poder público, das vivências e saberes locais na implementação do aterro hidráulico da Praia de Ponta Negra, juntos, os grupos co-criaram (Schäpke et al.,2018), como estratégia de enfrentamento, um instrumento de planejamento popular e gestão urbana baseadas na ciência para enfrentar a crise ecológica. Trata-se do Plano Setorial Urbanístico- Ambiental à luz da emergência climática. 

Iniciando seu segundo ano de atividades, o projeto VIVERES vem realizando um conjunto de oficinas, conduzidas por ferramentas de cartografia social, como um exercício de coprodução (Schäpke et al.,2018) do Plano Setorial popular. Isso porque os cenários vividos e os desejados/futuros – elaborados por meio de outro modo de ocupar/viver o espaço – postos nas oficinas de diálogo, são o combustível para a construção das medidas de adaptação do território. Estas serão sistematizadas pelos agentes acadêmicos e validadas (ou não) em oficinas de devolutiva, pelo conjunto de agentes do EMR. 

Quanto ao caráter experimental da proposta – buscando ir além da geração de conhecimento teórico, sem prescindi-lo (Schäpke et al., 2018) – entende-se que este será dado pelo desenho/projeto/simulação das medidas de adaptação do setor, etapa ainda não realizada. 

Sobre os papéis dos agentes e seu impacto nos procedimentos metodológicos, importa mencionar que, aparentemente, a literatura internacional sobre os LMRs e EMRs, quase sempre versa sobre agentes locais “profissionais”, com algum conhecimento técnico e atuação na área da pesquisa. Aqui, no entanto, trata-se de um conjunto heterogêneo de moradores, trabalhadores e ativistas socioambientais, buscando criar um produto que lhes represente no contexto de uma governança para o desenvolvimento sustentável. 

Observado o potencial para promover ações de impacto e empoderamento local, a estreita relação/dependência entre contexto, processo e produto acaba por o limitar o potencial de generalização das estratégias adotadas pelo projeto VIVERES. A limitação, no entanto, não lhe é particular, sendo também registrada na literatura internacional. Deste ponto de vista, o processo de avaliação do projeto deve “[…] implicar o enfraquecimento de critérios clássicos de qualidade, como a fiabilidade e a validade externa, em nome de uma maior validade ecológica (o contexto do estudo aproxima-se do mundo real)”(Schäpke et al., 2018, p. 106). 

Finalizando esta breve reflexão sobre o ciclo de co-criação/co-produção/co-avaliação (Schäpke et al., 2018) do projeto VIVERES, entende-se que, devido à natureza da metodologia e seu ponto de partida, uma problemática real, os processos de avaliação focados apenas nos resultados tangíveis e documentáveis/documentados, podem não alcançar seus reais impactos. Assim, também é importante focar/avaliar os limites e possibilidades da metodologia de escuta; a potência e qualidade das relações desenvolvidas entre os agentes participantes; a impulsão dos processos de engajamento popular e empoderamento das lideranças locais, bem como da incorporação de novos ativistas à pauta das mudanças do clima; a consolidação ou ampliação do conhecimento acerca das mudanças climáticas; a apropriação de ferramentas de governança urbana, dentre outros. 

** Ancorado no Laboratório de Habitação – LabHabitat do DARQ/UFRN, baseia suas atividades no princípio da gestão democrática da cidade, construindo junto com os habitantes dos territórios populares de Natal, estratégias para, por um lado, reafirmar e fazer cumprir, pelo poder público, as conquistas sociais institucionalizadas sob a forma do direito à moradia, ao transporte, ao lazer, etc., e, por outro, contribuir para o fortalecimento da política de base comunitária, capaz de construir narrativas e ações criativas, contra hegemônicas. O Fórum mantem, desde sua criação, em 2018, parceria com o Instituto de Políticas Públicas (IPP/UFRN) e o INCT Observatório das Metrópoles Núcleo Natal. Mais recentemente, desde 2023, também se coloca como parceiro do INCT Klimapolis.

Gratuito

Inscrições

As inscrições devem ser feitas aqui.

A seleção será feita por ordem de inscrição.

As inscrições estarão abertas até o inicio da atividade, no local, desde que haja vagas disponíveis.

Participe da programação de debates, oficinas e atividades associadas!

HOJE (09.10)

9h – oficina Arquitetos e engenheiros face aos desafios climáticos

14h – Fórum SP 25 Sessão Temática 5. Promover moradia digna e justiça climática

15h – Mini-oficinas de Biomateriais no Lab Vivo

16h – Fórum SP 25 Sessão Temática 6. Governar com inclusão, participação e controle social

17h – Mini-oficinas de Biomateriais no Lab Vivo

17h30 – sessão 6 da mostra Cinema, arquitetura e sociedade: registros de um mundo quente na Cinemateca

18h – Fórum SP 25 Painel 3: Governança, Representação e Participação Social 

NOS PRÓXIMOS DIAS (10 a 14.10)

10.10 | 14h30 – mesa Periferia Sem Risco no contexto de mudanças climáticas

10.10 | 16h – mesa Conhecer para Transformar: Planos Comunitários de Redução de Risco e Adaptação Climática

10.10 | 18h30 – mesa Adaptação inclusiva: Soluções Baseadas na Natureza nas Periferias

10.10 e 12.10 | 9h – Oficina desenho: a arquitetura de Oscar Niemeyer no Parque Ibirapuera e o desafio climático

11.10 e 12.10 | 9h – oficina Inventa(rio) Fronteiras: Jogando por cidades multiespécies

11.10 | 10h – oficina Maleta pedagógica Elémenterre

11.10 | 11h – mesa Aprendendo a habitar o antropoceno: a crise da arquitetura

11.10 | 14h – mesa Architecture for Learning and Civic Use

11.10 | 15h – mesa Culture and Public Architecture

11.10 – 15h – oficina Maleta pedagógica Elémenterre

11.10 | 16h – mesa Reconnecting with Nature & Circular Design

11.10 | 17h – mesa Architecture of Belonging: Interpreting Heritage Through Place

11.10 | 19h – Palmas: Há 36 anos, a capital ecológica do Tocantins

12.10 | 10h – mesa Vivência: Refúgios Climáticos e Espaços Públicos Naturalizados, com Ecobairro

12.10 | 10h30 – mesa Infâncias e Clima: Justiça Climática em Territórios Vulneráveis

12.10 | 10h30 – Oficina de Birutas com o Coletivo Flutua 

12.10 | 15h – mesa Fazer muito com pouco: arquiteturas para um planeta em transição com Esteban Benavides do escritório Al Borde

12.10 | 16h30 – mesa Terra – construindo um futuro sustentável e democrático 

12.10 | 18h – mesa Viver Com – Pavilhão da França na Bienal de Veneza e AJAP – Álbuns de Jovens Arquitetos e Paisagistas

13.10 – atividade Ação Pantanal no IABsp

14.10 | 10h – mesa Panorama Urgente! O espaço como ato de permanência

14.10 | 18h – Lançamento do Guia “Educação Baseada na Natureza”

PARTICIPE! É TUDO GRATUITO!

E tem muito mais até 19 de outubro!

(Atividades e projetos ainda estão em processo de inclusão; em breve o site estará completo)

NOTA DE PESAR

Em profundo pesar, o Instituto de Arquitetos do Brasil – Departamento de São Paulo (IABsp) lamenta o falecimento do arquiteto e paisagista Kongjian Yu, uma referência global em urbanismo ecológico, e dos membros de sua equipe que o acompanhavam, tragicamente vitimados durante a gravação de um documentário. O instituto destaca a honra de tê-lo tido como participante na 14ª Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo, onde sua visão transformadora fortaleceu o diálogo entre desafios globais e realidades locais. O IABsp ressalta que a contribuição de Yu, que transcende fronteiras, permanecerá como inspiração para gerações e expressa suas condolências à China, aos familiares de todos os falecidos, amigos e a todos os impactados por seu gênio e dedicação. Leia a nota completa aqui.